Análise: os conceitos de Roger Machado e como eles podem ser aplicados no Atlético

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05/01/2017 - 09:49

Por: Lucas Silva (@LucasSilva1908)

Qual o nome ideal para ser o técnico do seu time? A pluralidade de estilos tanto dos técnicos como do DNA dos grandes clubes faz a pergunta ser dificílima e na maioria das vezes clubes brasileiros erram muito nessa incessante busca.

Depois de períodos vitoriosos sob comando de Cuca e Levir, o Atlético teve experiências de insucesso com Diego Aguirre e Marcelo Oliveira. O próximo passo foi buscar um novo técnico para 2017. Roger Machado é um dos técnicos mais promissores da atual geração brasileira e tem tudo para levar o Galo ao topo em qualquer torneio.

A característica mais marcante enquanto Roger treinou o Grêmio foi apresentar um time com estilo e ideias claras em todos momentos do jogo. Não importava a mudança no esquema tático ou entre os 11 titulares, sempre seus jogadores mantinham um padrão de atuação. Formar um Atlético com identidade será o norte para o novo técnico dar alegrias à torcida alvinegra.

Sistema defensivo e marcação

O Atlético pós-2012 é marcado por ter um ataque eficiente, mas uma defesa com espaços bem utilizados por seus rivais. Acertar o sistema de marcação será o principal desafio de Roger no comando do Galo.

O antídoto utilizado por Roger será um time atacando ou defendendo em bloco, ou seja, os 10 jogadores de linha bem próximos. Isso possibilita, ao perder a bola, uma das características marcantes do técnico: a pressão com mais de um jogador a fim de recuperar a posse de bola nos cinco segundos imediatos à perda. “Quem tá próximo para jogar, tá próximo para marcar” diz o treinador.

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Figura 1 | Após a perda da bola o time pressiona com três jogadores o portador da bola / Reprodução: Data ESPN.

Se essa pressão inicial não obter sucesso é iniciada outra fase defensiva com todos jogadores buscando formar duas linhas de quatro bem compactas, com pressão no adversário que está com a bola e as linhas flutuando de acordo com o lado em que a bola está. Essa flutuação, juntamente com a compactação, permite uma superioridade numérica no setor da bola, dificultando a vida do adversário para encontrar espaços em busca do gol.

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Figura 2 – Observe a compactação das linhas, tanto na largura entre as linhas, quanto no comprimento das linhas / Fonte: Painel Tático

Toda marcação ocorre com intensidade, sendo o time um organismo vivo onde todos atacam e todos defendem. “Nosso 1º defensor é o atacante, e o 1º construtor é o goleiro” é outra frase bastante utilizada pelo técnico responsável pela segunda melhor defesa do Brasileiro em 2015.

Mas Roger também é criticado por escolhas defensivas, principalmente por priorizar jogadores mais técnicos para manter sua construção do jogo de troca de passes por todo campo. Sofreu no Grêmio, em algumas partidas, com contra-ataques e também para segurar resultados com o time não sabendo se fechar como deveria.

As ideias de Roger para atacar

Roger diz ser admirador do futebol-raiz brasileiro e isso diz muito sobre seus times. O rápido toque de bola com movimentação, o famoso toca e passa, para criar espaços era sua marca registrada. Seu ex-time sabia como poucos ser mortal no contra-ataque (o Galo que o diga!) e mesmo assim era competente contra defesas bem postadas. Ou seja, um time bastante adaptável às condições do jogo do técnico que gosta de ter a posse de bola e uma saída de bola pelo chão.

Gol do Grêmio contra o Atlético em 2015 evidencia conceitos de jogo de Roger

Utilizou-se bastante de conceitos como amplitude – dois jogadores bem abertos a fim de espaçar a defesa adversária e gerar espaços – e também do jogo entre as linhas defensivas do adversário, com Luan, Douglas e Giuliano. Aliás, o último realizava um movimento interessante saindo da meia direita e indo circular pelo meio, assim gerando superioridade numérica no setor do meio-campo e aumentando a capacidade de criação do time. Outro conceito é a saída de três: quando um dos volantes se junta aos dois zagueiros e espetando os laterais, melhorando a saída de bola e confundindo a defesa adversária com jogadores se movimentando de forma diferente.

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Figura 3 – Observe como os meias laterais do 4-2-3-1 já se projetam para gerar amplitude contra a defesa rival. Esse é o jogo em que o Grêmio ganhou de 2x0 contra o Galo no Mineirão, em 2015 / Fonte: Reproução - Sportv

A criação de chances do Grêmio sempre começava com uma dupla de volantes técnicos e com bom passe. Maicon e Walace eram os responsáveis pela rápida circulação da bola, sempre se projetando como opções de retorno para inverterem a bola e o time continuar a trocar seus passes rapidamente. Se tornavam os principais armadores do time. Certamente eram o diferencial no controle das partidas exercido pelo time.

Outra novidade foi utilizar Luan como centroavante móvel entre as linhas adversárias para deixá-lo como opção de passe em velocidade nas costas da defesa ou mesmo um passe de costas à defesa para continuar empurrando o time rival para o mais próximo possível de seu gol.

O trabalho realizado para seu 10 clássico encaixar nessa engrenagem foi outro ponto interessante. Douglas participava ativamente da marcação, movimentava para dar e criar opções de passe, além de entrar na área para finalizar.

Um problema foi a falta de um atacante com maior poder de fogo, visto que a criação de chances do time do Grêmio existia em grande escala, porém a quantidade de gols era baixa. Para isso o Galo possui Fred, devendo sanar com a necessidade do treinador em ter um time mais contundente na frente.

Fragilidade na bola parada defensiva

Certamente Roger perdeu muitas noites de sono com o problema. O Grêmio sofreu vários gols originados em escanteios e faltas próximas a área, e por consequência, perdeu pontos preciosos na luta pelo título brasileiro e na Copa Libertadores.

Após analisar vários lances é possível perceber erros de posicionamento e, principalmente, de atenção dos jogadores. O técnico utilizava uma marcação mista: marcava individualmente os melhores cabeceadores do adversário e posicionava jogadores em zonas estratégicas dentro da área, como por exemplo a primeira trave e a pequena área.

As jogadas aéreas são muito dependentes do individual. Se um jogador se posiciona errado ou não tem a atenção necessária, logo, o time terá dificuldades nesse tipo de jogada. É gritante em alguns lances a passividade de alguns marcadores do Grêmio, fixando a atenção somente na bola e acabando por serem pegos de surpresa por uma aparição do rival.

Certamente Roger reviu seus conceitos sobre o tema e deve apresentar mudanças nessa marcação. O bom aproveitamento em bolas aéreas de jogadores como Leonardo Silva, Erazo, Felipe Santana será de grande valia ao técnico.

Métodos de treinamento

“Treino é jogo e jogo é guerra”, essa frase se encaixa muito bem no que o novo técnico do Galo procura em seus treinamentos. Roger utiliza treinos de curta duração e alta intensidade, tendência europeia de alto rendimento há alguns anos. Assim, o time passa a ter uma real simulação da “pegada” que deve apresentar no jogo, além de obter maior adequação àa alta intensidade proposta pelo técnico, que é uma de suas marcas. Outro fator muito característico do seu Grêmio era um jogador, após realizar um passe, movimentar-se em projeção para o espaço vazio, possível nos jogos pois era praticado nos treinos.

Os treinamentos são planejados antecipadamente seguindo a periodização tática. Mas do que se trata? É um modelo criado por estudiosos portugueses a fim de criar treinos desenvolvedores das três principais vertentes em um jogador (física, técnica e tática) trabalhando-as em conjunto, contrastando com os treinos mais ortodoxos dos anos 90 com trabalhos físicos, técnicos e táticos separados. Um exemplo é José Mourinho: tornou-se o Special One na Inglaterra muito por esse método revolucionário à época, levando os jogadores a praticarem futebol muito intenso com o time no limite físico. Utilizando tal estratégia nos treinos o português foi bicampeão inglês e colaborou na recente revolução do futebol mundial.

Logo, com vários conceitos trabalhados em apenas uma sessão de treino os jogadores otimizam o tempo - seus corpos não são máquinas para treinarem a todo momento - e fixam o estilo requerido pelo técnico a ser utilizado no jogo.

Expectativas para o trabalho no Atlético

Por fim, Roger revelou vários nomes desconhecidos para o certame brasileiro: entendimento tático do talentoso Luan cresceu muito, Walace tornou-se volante técnico e de bom senso na marcação, o drible e a recomposição cresceram em Everton, além do lateral Marcelo Hermes, pretendido pelo Benfica, e Jaílson, importante para o rodízio no elenco. Mas não só revelou jovens como resgatou o futebol de peças em baixa, como Maicon, Marcelo Oliveira, Galhardo e Douglas.

Após o meio do ano de 2016, o Grêmio passou por vários resultados ruins e por pressão externa Roger foi demitido. A queda de rendimento começou quando Roger perdeu Giuliano para o Zenit-RUS. Jogador muito qualificado fisicamente, tecnicamente e taticamente, não à toa é artilheiro da Liga Europa e convocado para a seleção brasileira. Também existem outros fatores, como Luan sendo utilizado no lado do campo e não na referência, a perda da dupla Walace e Luan para os jogos olímpicos e os inúmeros gols sofridos em jogadas de bola parada. Faltou também um maior pragmatismo com nomes pouco técnicos e fortes na marcação como Kanneman e Ramiro, jogadores titulares na conquista da Copa do Brasil pelo Grêmio comandado por Renato Gaúcho.

Portanto, levando-se em conta o rendimento e a riqueza de ideias do time de Roger Machado é possível classificar a contratação como certeira pelo presidente Nepomuceno. Certo é que não veremos todas características do seu Grêmio no Atlético de 2017 pelas diferenças entre os elencos e também pela crítica pessoal do técnico a fim de melhorar erros das suas equipes.