Canto do Leitor – 7616 dias depois

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15/08/2013 - 15:10

92 conmebol - Canto do Leitor - 7616 dias depois

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Texto enviado pelo leitor Daniel da Millo

Dia 16 de setembro de 1992, eu então com 14 anos, tive o prazer de ir com meu pai (que por ironia do destino se chama OLÍMPIO) ao jogo do GALO contra o Olímpia, na primeira partida da final da Copa Conmebol.

Da arquibancada, vi os dois gols e é nítida a lembrança do placar eletrônico preto com lâmpadas amarelas intermitentes: Goooool Negrini.... Goooool Negrini.

Aquela torrencial quarta-feira não foi minha primeira vez no Mineirão. Na minha memória mais distante está cravada a imagem do Rei de braço em riste como um “black panther” e eu na geral sentado no pescoço do velho já sentindo o poder daquela Massa, daquele gesto, daquele time.

Após o Reinaldo passar na nossa frente, meu pai em êxtase literalmente rolou comigo no chão da geral. Cena e sentimento inesquecíveis! Segundo meu velho, era um jogo do GALO em 1981 e eu estava com 4 anos, mas  ele não sabe “precisar” a data. Data não importa. Nunca importou. Afinal, depois de muitas mazelas o destino nos reservara a consagração de um sentimento 7616 dias depois dos 2 gols do Negrini.

Escrever aqui o que é ser atleticano é “chover no molhado”. Quem é, sabe. Aliás, quem é, SENTE! Segundo Fernando Pessoa, “Navegar é preciso, viver não é preciso”. Pois bem, quando tive consciência que o “preciso” que ele se referia era a “qualidade do que é preciso, exato, rigoroso” e não o fato de “precisar de algo” (como precisamos do ar, do pão ou do GALO)  saquei que Fernando Pessoa, com um “flashforward”, se referia ao sentimento do Atleticano.

Minha epifania mostrou que a nau atleticana não navega, ela VIVE. Só isso para explicar tantos momentos em que a lógica e a matemática apontavam o GALO como campeão, mas o “Sobrenatural de Souza” dava o ar da graça e o GALO sucumbia.

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Imagem: Internet

A nau do GALO VIVE! Por isso nunca teve precisão, exatidão ou rigor.

Vivemos pelo GALO, sentimos o GALO. Somos atleticanos antes de tudo. Ser atleticano me moldou para ser um pai, marido e filho melhor. Pois VIVO. Pois sei que a vida não é justa, não é regular, não é um roteiro escrito. Sei que se não der certo é só aguardar que vai dar um dia!

O dia chegou! 7616 dias depois, o dia chegou!

Semana conturbada sem dormir, sem trabalhar direito e sem mais unhas pra roer.

Após milagres, desacertos, e batalhas na Libertadores 2013, o destino impreciso, permitiria mais uma vez eu ir com meu velho ao Mineirão ver nosso GALO contra o mesmo Olímpia.  Quase 11 anos depois estávamos na mesma arquibancada (por pouco não ficamos no mesmo local).

Antes da bola rolar eu só pensava naquela frase que sempre me corroía: “Nunca Serão”! A “precisão” apontava como Campeão o Olímpia. Ainda bem que a nau do Galo vive e não é precisa. Pois agora “SOMOS”!

Contra tudo e contra todos, vi com meu pai e minha irmã os gols de Jô e Leo Silva. Vi da arquibancada a dura e improvável prorrogação. Vi o “preciso” escorregão do Ferreyra.

Não aguentei. Na hora dos pênaltis, fui para o banheiro do estádio, Com a cabeça molhada debaixo da temporizada torneira do banheiro, ouvia o grito da MASSA. Aqueles gritos eram minha TV e através dele, explodi de êxtase com o GALO CAMPEÃO e chorei igual a uma criança.

Ao sair do banheiro, vi uma cena incrível: os portões foram abertos e a multidão que estava do lado de fora invadiu o Mineirão em transe. Uns rolavam no chão como eu em 1981. Muitos choravam e expurgavam todas as mazelas de outrora. Outros parados, incrédulos, e muitos pulando de alegria.

Corri para arquibancada para achar meu pai, mas não consegui. Vimos a entrega da taça separados, mas juntos por esse sentimento que mobilizou 10 milhões pelas Gerais, pelo Brasil e pelo mundo.

Nunca nos preocupamos com títulos. Tê-los não nos torna mais ou menos Atleticanos. Isso é coisa dos vaidosos. Mas confesso que conquistar a América foi bom demais. Ter meu pai e minha irmã do lado foi sublime.

Dia 24 de julho de 2013, 7616 dias depois de 16 de setembro de 1992, vimos um GOL emblemático. Foi gol do Dadá, foi gol do Reinaldo, do Éder, do Marques, do Guará, do Cafunga, foi gol do Mario de Castro, do João de Deus, do Elias e Alexandre Kalil, do Belmiro, do Ligeirinho, do MEU PAI, DO SEU PAI, DA MINHA FILHA, DO SEU FILHO, DA MINHA ESPOSA, de 10 milhões, DO MUNDO!

AGORA O GALO É DO MUNDO E O MUNDO APRENDEU que nau que VIVE, mesmo que tardiamente, também chega ao cais.

Terra a vista!

Somos o melhor time da AMÉRICA! SOMOS DO CLUBE ATLÉTICO MINEIRO!

Daniel da Millo, Belo Horizonte, 25 de Julho de 2013.