Dia dos pais em preto-e-branco

Por:
13/08/2012 - 23:53

Texto enviado pelo leitor Roberto Lopes

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Fotos: Peagá

Hoje, como tenho feito todas as vezes, desde que o Galo voltou a jogar em BH, fui ao Independência. Saí de casa com a intenção de fazer como sempre faço, vou de taxi, entro no Galo Na Veia, assisto o jogo, volto pra casa.

Só que hoje o dia foi um pouco diferente. Antes de mais nada, porque é dia dos pais e eu pude desfrutar da companhia da família num almoço gostoso e cheio de convivência e carinho, e tem pouca coisa que se compare a isso nesta vida.

Mas esse, infelizmente, não era o único motivo que fazia o dia diferente. Ao contrário do que tem sido minha rotina em dia de jogo do Galo, quando saí de casa, estava de coração pesado, preocupado mesmo, com as notícias que tinham pipocado na internet e, principalmente, na minha timeline do Twitter, sobre a mais recente “crise enlatada” do Galo. Estava preocupado porque, de uma certa forma, podia fazer sentido. Rever e Danilinho tinham mesmo sido filmados brigando em Sete Lagoas, o Kalil tinha mesmo convocado a todos para uma conversa, e aí eu vejo a avalanche de notícias ruins que depois se mostraria ser apenas mais uma irresponsabilidade de uma imprensa esportiva marrom que vem ganhando espaço nos últimos anos: Kalil brigou com os jogadores, Ronaldinho ficou da vida e desdenhou do Galo (essa parte, em especial, me deixou irritado), Réver foi omisso, Kalil tirou Ronaldinho do jogo com o Vasco, jogadores imploraram e ele voltou atrás. E, por isso, mas sóóóó por isso, Ronaldinho poderia entrar em campo.

E eu pensava com meus botões: será possível que vai dar tudo errado por uma bobeira dessas? O time parece tão unido, está focado e jogando tão bem, bem como eu não via há décadas, e agora vamos jogar isso tudo fora logo no jogo com o vice-líder do campeonato? Parecia ruim demais para ser verdade, mas “nosotros” atleticanos somos escolados nisso, certo? Ruim demais, nos últimos tempos, tem sido com a gente mesmo. Dois anos seguidos escapando de rebaixamento no finzinho do campeonato, depois de uma década pífia, me deixaram cabreiro.

Quando eu subia o morro da Rua Ismenia Tunes, aconteceu uma coisa engraçada. Eu comecei a me sentir mais tranquilo, sem nenhuma razão aparente. Aos poucos, eu olhava em volta, via aquele mar de gente fardada de preto-e-branco e pensava que não, não ia dar errado. Não pelo motivo que estavam dizendo, pelo menos. O Kalil pode ser chato e grosso com as cobranças (nem sei se é mesmo, não o conheço), mas já mostrou que não é burro, os jogadores podem ser inocentes de se deixarem filmar em uma situação constrangedora, mas também não são burros e sabem a oportunidade que têm em mãos. E Ronaldinho, mais do que todos, tem a perder se algo assim acontecer e ele virar (de novo) o jogador-problema do elenco. Não, pensei comigo, não vai ser assim. No fundo, eu acho que me recusava a acreditar que essa torcida ia ser pega no contrapé mais uma vez.

Cheguei faltando 15 minutos para o jogo e o estádio estava lotado, todo mundo com os balões que haviam sido distribuídos e cantando muito. Ou seja, tudo normal. O Galo Doido entrou, torcida gritou. Normal. O Vasco entrou, torcida vaiou, normal. O Galo entrou, torcida cantou, aplaudiu, gritou o nome, mais do que normal.

Começou o jogo e meu medo de que as notícias maldosas fossem verdadeiras, que já tinha ficado pelo morro da Ismênia Tunes, foi devidamente sepultado quando vi que o time estava se matando em campo. O que, aliás, tem sido muito normal.

Resumindo: até então, parecia tudo... normal!

IMG 0042 300x200 - Dia dos pais em preto-e-brancoLedo engano.

O que aconteceu a seguir esteve longe de ser normal. Até mesmo para o Galo de hoje. O time foi perfeito na defesa e no ataque. E atacava, atacava, atacava, e parava uma após outra das jogadas do Vasco. Quem disser que o jogo foi igual não viu a mesma partida que eu. O Galo tocou mais a bola, envolveu o Vasco, matou as jogadas de ataque contrárias, MANDOU NO JOGO! O Vasco teve uma ou outra chance, sim, mas em jogadas isoladas e fora do contexto do jogo. Quem construiu jogadas, do início até o fim do jogo, fomos nós. O Galo só não fez mais gols porque errou nas finalizações. A defesa do Vasco, que não tomava gols há sete jogos, foi envolvida e furada várias e várias vezes, por lançamentos que partiam dos pés de Ronaldinho, de Guilherme, de Marcos Rocha, de Réver, e sei lá mais de quem. Acho que até o Pierre deve ter feito lançamento ontem.

O Galo estava acabando com o Vasco.

Só um porém: a bola não entrava. Não entrou no primeiro tempo inteiro, passou o intervalo, começou o segundo tempo, ela não entrava. Essa sucessão de chances de um time que estava jogando MUITO, contra um adversário que a tabela do campeonato (deste e do ano passado) nos forçava a respeitar, foi construindo um ambiente de tensão tão forte que, em determinado momento, eu estava prestando tanta atenção no jogo que achei que estava calmo. De novo, um engano, eu estava era anestesiado. E acho que estavam todos assim. Digo isso porque, quando Ronaldinho aprontou pra cima da defesa pela enésima vez e cruzou e Prass desviou a bola para esta encontrar Jô, primeiro, e depois a rede, eu gritei e pulei e vibrei como sempre, mas como nunca antes neste campeonato. A minha vibração, e a dos outros que estavam perto de mim, foi fora do normal. Parecia que a gente tinha rompido uma parede de ar, invisível mas tão densa que não estava dando para respirar. Acho que nunca abracei tanta gente em 30 segundos como ontem. E não fui eu, foi todo mundo. Foi uma catarse generalizada, coisa que só grandes emoções dão conta de fazer com a gente.

Continuou o jogo, e o Vasco, que deveria ter pressionado o Galo, foi devidamente neutralizado por um time que estava, definitivamente, acima dos times normais. Bem acima.

A esta altura, eu pensava: se um time que joga assim está em crise, então é porque vai ser campeão de qualquer coisa de que participar. Se isso é racha no elenco ou perda de foco, então tá, pode jogar sem foco e união o tempo todo, vai ganhar de qualquer jeito.

Maldita imprensa marrom, para quê isso? Ninguém saiu ganhando. De uns, tirou tranquilidade. Para outros tantos, é a reputação que pediu licença e foi pelo ralo (em alguns casos isso já não faz muita diferença, é verdade). Aliás, acho que, se serviu a algum dos envolvidos, foi ao Galo, que o Cuca não é bobo nada e deve ter utilizado a montoeira de baboseiras para unir e motivar ainda mais o time, se é que isso é possível. Serviu de lição para ficar com os dois pés atrás com gente que, como diz o Chico Maia, quer lamber as botas daqueles que podem ser seus futuros patrões. É triste, mas é fato.

Acabou o jogo e eu estava tão eufórico que desci o morro pensando: preciso andar, vou voltar para casa andando. E andei. Andei uma boa meia hora antes de me sentir em condição de sentar no espaço apertado de um táxi para terminar de voltar para casa.

Quando cheguei, beijei minha esposa e minhas filhas, que antes do Galo fizeram meu dia dos pais super-especial, e disse: vou correndo tomar um banho, porque a única parte de mim que está lavada é a alma!